| Crónicas da vida airada (ou não) #32 |

Então esse Natal? O meu correu muito bem, tirando a parte de ter comido que nem uma lontra, mas não me vou agora preocupar com este tipo de mesquinhices, que o mal já está feito.

Queria mesmo era partilhar uma história natalícia que ocorreu em casa dos meus pais há uns anitos, pelo que já passou o tempo suficiente para poder falar e/ou escrever e/ou rir sobre isso com frontalidade e sem receio de represálias. Sim, porque a situação tem muita piada mas, na altura, nem tanto.

Em casa dos papis comemoramos o Natal no dia 24, com um jantar com a família mais próxima, ou seja, aqueles de quem gostamos mesmo e não temos de fazer fretes nem falsos sorrisos porque a ocasião assim o exige. É uma espécie de família do coração dentro do amplo conceito que é a família.

Ora, dita a tradição que, depois de comermos e bebermos como se não houvesse amanhã, ficamos na conversa até à meia-noite, altura em que distribuímos os presentes.

Dita também a tradição que, terminada essa fase um tanto ao quanto consumista,  todo o papel de embrulho vai diretamente para a lareira, que a casa fica quentinha e o espetáculo é bonito de se ver (uma vez, um irlandês que vivia com o meu irmão em Londres disse-lhe que não conhecia povo que tivesse uma tara tão grande com o fogo como o nosso e, embora nunca tivesse pensado nisso, estou tentada a dar-lhe razão: há lá coisa mais reconfortante do que nos deixarmos hipnotizar por umas achas na lareira?). Adiante.

Distribuímos os presentes, como de costume, e fomos atirando para a lareira os papéis. O meu pai, apercebendo-se de que em cima do sofá estava um monte de papel, pegou naquilo tudo e, feliz da vida, pumbas, lareira com ele. Mal acabou de o fazer ouviu-se um Nãããooo.... - deseperado q.b. - da minha mãe.

Já perceberam, certo?

O papi, junto com a papelada, enviou para a fogueira todos os presentes que a mami recebeu. Pois...
Depois de uns segundos, em que ficou toda a gente imobilizada, com os olhos postos nas chamas, começámos a dizer aquelas coisas que se dizem nestas alturas: não faz mal, são só bens materiais, o importante é que ninguém se magoou, blá, blá, blá. Mas isso não evitou que a mami vertesse uma lagrimazita (por mais que tentasse disfarçar) e, nesse Natal, o papi foi para a cama mais cedo (tadinho, ficou tão triste).
Como somos uns queridos, todos nós comprámos presentes novos para oferecer à minha mãe e agora já estamos na fase em que todo o santo Natal fazemos uma piadinha com o raio do papel de embrulho, o dissimulado.
E, claro, passámos a ser um nadita mais cuidadosos. 😃